Bruna Camargo

Oi, Roseana, tudo bem? Quero deixar aqui um depoimento para você. Tive contato com seus poemas no início da minha adolescência (hoje tenho 29 anos!). Se eu não estou enganada, foi por meio de uns livrinhos que o governo do estado de São Paulo distribuiu para as escolas públicas. Comecei a frequentar bibliotecas com uns 6 anos, mas foi ali, com 11/12 anos que me apaixonei por suas palavras e aprendi a amar poesia. Eu lia e relia seus poemas, sabia vários de cor hahah Foram eles que me inspiraram a escrever, inclusive eu dava aquela imitadinha básica no seu estilo, né! Cheguei a ganhar um concurso com 15 anos, com um poema original, e quando leio hoje não consigo não ver uma pitada de inspiração na Roseana. Escrever poesia foi uma forma de desabafar e refletir sobre mim mesma nessa fase de adolescência que é meio conturbada. Até hoje mantenho o hábito de escrita e guardo com carinho no meu coração seus poemas tão singelos. Fiquei muito feliz de ter encontrado você por aqui e ter a oportunidade de dizer: obrigada! Seu trabalho é lindo e foi a semente que gerou muitas coisas boas em mim em relação ao universo literário. Espero que minha história tenha aquecido um pouquinho seu coração hoje. Abraços!

Roseléa Olimpo

Bom dia, amada! Acabei de receber pelo correio uma lindeza de livro: “COM A LUA NOS OLHOS”. Estou apaixonada! O livro começa a nos encantar pela capa, numa textura diferente nos faz senti-la a partir daí. Fiquei acarinhando o livro como se estivesse deitada sobre a areia sentindo com as mãos os seus grãos e admirando a lua. O título é outra lindeza, os diferentes tons de azul parecem piscar como se ela piscasse pra mim ( talvez pisque pra outros leitores também) dizendo : “viaje em mim”! Ao abrir o livro, os comentários (vou chamar assim) de Penélope Martins dizem maravilhas e encantos sobre essa obra de Arte. Tudo verdade e quem te conhece amada (ao vivo e aos abraços, ou através de suas mais de cem obras) sabe que Penélope foi perfeita! Em cada página um suspiro de surpresa, de encantamento , de beleza. As ilustrações de Regina Rennó são “maravilindas”. Duas obras de ARTE perfeitamente fundidas num só olhar de leitora, assim eu as vejo e nelas quero entrar, viajar, contemplar. Obrigadíssima por essa LINDEZA de POESIA! Sei que foi escrita pra todos, mas quando leio e releio sua dedicatória aos netos queridos, leio também: e a Roseléa que ama a poesia, em especial, a minha. ( Quem for seu leitor e quiser, pode ler em seu livro desse jeito também.) Roseléa Olimpo

Prof. Dr. Rafael Santana

Habitar os olhos de um gato Rafael Santana – UFRJ […] Viens, mon beau chat, sur mon coeur amoureux; Retiens le griffe de ta patte, Et laisse-moi plonger dan tes beaux yeux, Mêlés de métal et d’agate. […] (Charles Baudelaire) Gato que brincas na rua Como se fosse na cama […] És feliz porque és assim, Todo nada que és é teu. Eu vejo-me e estou sem mim, Conheço-me e não sou eu. (Fernando Pessoa) Habitar os olhos de um gato não é, nunca foi, e jamais será uma experiência da ordem do simplório. Porque para que um ser humano logre viver nos globos oculares de um felino faz-se inicialmente necessário que ele, enquanto sujeito, anele tornar-se agente de perscrutação da sua própria sombra, no intento de vislumbrar, quiçá, a sua claridade interior. Gatos são animais independentes, misteriosos, místicos: luz e trevas que emanam de corpos que se movimentam em ziguezague, lascivos e inebriantes, em estésicas dobras de linguagem. Não é por acaso que eles tanto fascinaram – e não cessam de fascinar – os poetas! Enfrentar os nossos gatos internos é, com efeito, uma tentativa de autoconhecimento que o poema de Fernando Pessoa, inscrito na epígrafe, bem sinaliza. Ou, nas palavras mais contemporâneas de Nise da Silveira, “O gato é um ser essencialmente livre e essa liberdade desafia o homem”. Eis a reflexão de abertura do livro Gatos, publicado a quatro mãos por Roseana Murray e William Amorim pela Editora Viegas, de São Luís do Maranhão, em 2019. Anunciado, pois, o desafio de liberdade expresso na epígrafe de Nise da Silveira, os poemas de Gatos são precedidos ainda de uma belíssima apresentação de Arlete Nogueira da Cruz, que nos dá a ler um texto enxuto e de preciosa seleção vocabular. Dessa apresentação, recorto estrategicamente um sintagma bastante interessante, que a autora utiliza para se referir ao assomo dos felinos aquando do seu desejo de aconchego junto aos homens: aproximação orbital. Elásticos, os gatos achegam-se devagarinho, enroscam-se por entre as nossas pernas, deixam pouco a pouco que toquemos os seus corpos mornos e macios. Magnéticos, os seus olhos de metal e ágata se cruzam com os nossos e nos impõem o desafio: decifra-me / decifra-te. Gatos é precedido ainda de mais dois paratextos: o primeiro, de Roseana Murray; o segundo, de William Amorim. Roseana Murray alude à metáfora do jogo para elucidar o processo de construção dos poemas: fios, tecidos, sedas, tafetás ora lançados por ela, ora por William Amorim, cada um com a sua linha na agulha, prontos a contar, a recontar e a acrescentar um novo ponto. No fundo a pergunta e o repto lançados por Roseana Murray ao final do seu pequeno paratexto – “Os gatos são decifráveis? Leia o livro para saber!” – já abrem o filão de pensamento de William Amorim que, como psicanalista, incita-nos à surpresa da descoberta de um pouco mais de nós mesmos no enfrentamento dos nossos gatos de linguagem. Por outros termos, é como se o corpo do gato ativasse um fio capaz de alinhavar o texto em palavras: o gato é um devir; é uma linguagem desejante da sua escrita; linguagem obscura que, quando executada, se torna solar não porque decifrada, mas porque transformada em poesia, ou melhor, naquilo que se desvela para tornar a velar… Sobre esse tema específico, considero paradigmáticos estes dois poemas: De madrugada, quando os gatos que te habitam podem sair do seu coração e andar pela casa sem medo, dormes o sono dos justos como se tua última noite. Mas quando os gatos que te habitam retornam cansados ao teu coração de sal e sol, andas pelas ruas insone. (AMORIM, 2019, p.29) E William Amorim prossegue: Mais silencioso que espelho, Mais aventureiro que o tempo, Mais indecifrável que esfinge. Gato, dorso de solidão e carícia, A liberdade é teu segredo. (AMORIM, 2019, p.62) Na página 56, a pergunta inicial de Roseana Murray é reiterada em poema: “Será que dá para decifrar / um gato / […] em língua humana?”. Ora, um gato não pode ser decifrado em língua humana e ambos os autores acabam por responder essa questão. A linguagem não dá conta do real; é dele apenas uma ínfima versão… Todavia, o sujeito-gato que se dramatiza, isto é, que no solilóquio de um discurso amoroso (e não nos esqueçamos de que a experiência do amor requer sempre a luz e a sombra) o sujeito-gato, repito, absorto nas dores e nas delícias de falar de si mesmo ou, se quisermos, de amar a si mesmo, de converter-se ele próprio em ser de linguagem, vê-se de repente assaltado por múltiplas lufadas de pensamento capazes de desviar o seu olhar, mudando, dessa feita, a sua relação com o mundo; alterando, enfim, a sua percepção das ocorrências. O ser e a linguagem não são decifráveis e é por isso que existe uma história da literatura, da arte, da filosofia, da psicologia. Significativamente, deixar que os nossos gatos interiores saiam da sombra e venham à luz é, reitero, uma busca de autoconhecimento. De fato, ao longo daquilo que se conhece por História da Humanidade, nunca deixamos de repetir a todo momento o eco da inscrição à porta do templo de Delfos: “Conhece-te a ti mesmo”. E assim como as explicações do oráculo eram, no fundo, a devolução de um outro enigma, ao tocar o limite da linguagem o homem que se autoanalisa é também ele aquele que desvela para tornar a velar. Na repetição desse processo, joga-se infinitamente o jogo da Esfinge: “Decifra-me ou te devoro”! O complexo de Édipo, motor da psicanálise nascente nos finais do século XIX, aduz, de forma muitíssimo interessante, o que é esse movimento de desvelar para velar outra vez, lusco-fusco, contraste entre claridade e escuridão. Afinal, Freud não explica!!! Ao contrário, Freud e Lacan permitem ao sujeito cognoscente a experiência a um só tempo gozosa e dolorosa do discurso, palavra advinda do termo latino dis-cursus, que é etimologicamente a ação de percorrer diversos lados, de transitar por distintos caminhos. E para tanto

Texto da Feira Literária de Trajano

Para Roseana Murray Você escreveu, Roseana! Avesso Quem sou eu em meu avesso? Que urdiduras na sombra Que tramas secretas Num quarto escuro de mim? Quem sou eu Quando durmo Ou quando, de olhos abertos, Me remeço para o futuro, Saltando ilhas e desertos? Quem sou eu Quando me confundo e tropeço Alço voo e mergulho? (Roseana Murray) Poema com um eu lírico, você própria, Roseana?! Ou um eu lírico nós todos?! Importa, não! A gente vai brincar de tentar responder, Com carinho e respeito, para você, O que esse eu lírico quer saber A gente acha que sabe. Quem é você? Quem é esta mulher Que, ao futuro marido Disse ser “despencada”? Ah, destino querido! Roseana despencada?! Ah, que seja uma penca Dessas! Que é esta mulher? Esta que, em cada orelha, Usava um brinco diferente? Estranhamente! Ah, era o que dava na telha! E ela, por coincidência ou não, Escreveu , lindamente, “Quem vê cara não vê coração?” Que lição! Não é boba, não! Ah, não! Quem é esta mulher singular, Se, de todas, a mais plural, Até no nome? Roseana: Rosa e Ana! Ah, destino apraz! Há anos, ela lavra Palavra por palavra E é capaz De nomear, ciente, Docemente O que a gente sente. E no seu poema, o eu lírico questiona, Roseana: “Quem sou em meu avesso?” A gente reflete e responde: Um avesso? Que nada! De Roseana? Como assim?! Ela nada em águas Mais profundas! Nada, nada, nada E o nada vira tudo. Ela É ser inquieto. E, dessa inquietude, Busca atitude. É dela! E cria e recria, Enfeita a vida! Mas não em linha reta Vida não é assim. Ela é feita de “Tantos medos E outras coragens”. Nela e por ela é preciso Ousadia, guerrear, Abrir o coração E seguir a direção, A que está lá em “Receitas de olhar” E pra bem enxergar! Tá bem? “Quem sou em meu avesso?” Nenhum avesso! Para Roseana A vida desenhou Os caminhos! E deles, cuidou , velou, E com que amor! “Fardos de carinho”! Ah, o destino! Sempre à espreita! Para Roseana, Soube traçar empreitada: Se ela, com sua casa Não casava, Por que não morar Onde o avesso e o direito Podem se encontrar? Em outras “Casas”, em “Tribos”. Lá onde moram bichos, Pessoas, flores, frutos… Sentimentos todos! Uma “Fábrica de poesias”?! Produzindo e espalhando Vida: matéria-prima do poeta? Roseana mora lá Onde o teto Por um “Abecedário Poético” Completo, é recortado, É costurado, É construído: Na tessitura do afeto! É lá que Roseana mora Nos livros. No agora. E essa casa Por “Classificados Poéticos” Pode ser dela, Minha e sua. É “Fruta no Ponto”. Amor de ponto em ponto, Mas não o final. Afinal, Roseana é imortal! E o eu lírico, ainda quer saber: “Quem sou eu Quando durmo Ou quando, de olhos abertos, Me remeço para o futuro, Saltando ilhas e desertos?” A gente quer responder: Ah, quem é você, Roseana, nessas horas? Acordada ou não, Com os pés no presente E olhos no futuro… Quem é você, nessas horas? A Roseana dos temas. Escolhe um e faz festa! Com ele, entoa versos e infesta Nossa vida de cenas e lemas! E, para você, Roseana, há tema? Hum! A gente acha que há trama Do destino Que tramou seu encontro Com o “Ou isto ou aquilo?” De Cecília Meireles! Licença poética Que Cecilia Sabia a quem dava: A alguém que não acreditava Poder unir e se regalar Com a alquimia que é Escrever e cozinhar. Roseana, perdão, E dispensa, ops! Quase a da cozinha, viu? Mas não, é a poética! O que a gente acha ( só acha) Que tudo com você, Assim, se dava Assim, de forma ética: “Ou amasso o pão Ou escrevo no chão. Ou escolho o pote de mel Ou prefiro escrever “Poemas no céu”!” Escrevia, cozinhava… E a magia acontecia: Não só em forma de receita Veio por um bilhete Mensagem perfeita de uma sábia professora: – “ Seus poemas são maravilhosos! Publica!” E , com eles, passou a encantar Nossos olhos de leitores curiosos! Sonho! Ele existe! Acredite! Você acreditou. Você acredita! E faz a gente acreditar!´ E sonha com a gente, lá, de lá À beira-mar, na Casa Amarela. Distribui “Rios de alegria”, nela E tenham certeza, toda gente! Mesmo que lá aja “A Bruxa da Casa Amarela”, Café, Pão e Texto é o que se acha. Alimento para o corpo e para a alma. Tudo tão direito! Tão perfeito Que extasia Por tanta fantasia Por tanta melodia! Oh! Dá vontade de soltar Suspiros de luz Só de pensar! “Quem sou eu Quando me confundo e tropeço Alço voo e mergulho?” – Questiona o poema, ciente: Desta casa amarela, Recheada de Corpo e amor Roseana, você, é a que Lança semente, E docemente, Alegremente, Magicamente, Espalha amor! E, como se isso não bastasse, Ainda nos oferece E nos aquece com … “Desejo de abraço Nunca passa. Abraço é o nó Mais delicado que há. Um braço aqui Outro lá E o coração se derrete O corpo afunda Na mais gigantesca felicidade.” A gente, Roseana, deseja te abraçar hoje. E hoje, amanhã com um braço aqui e outro lá, estamos perto! Mas depois, para sempre, seus textos serão esses braços, através dos quais nosso coração se afundará na mais gigantesca felicidade! Para você, todo nosso afeto e gratidão!

Luiz Antonio Aguiar

SUSPIROS DE LUZ De Roseana Murray, Ilustrações Walter Lara. Categoria: Juvenil A ancestral arte da poesia em haicais ganha em Suspiros de Luz, de Roseana Murray, a delicadeza dos momentos mínimos, que é toda a sua essência, mas eternizados em poderosas imagens poéticas. E que extraem desses momentos  relances diversos, por vezes inusitados, da luz, e de reflexos que somente a sensibilidade poderia enxergar como poesia. São poemas impressionistas, nesse sentido, captando instantes e fixando-os sob a forma do haicai, que tem toda a sua magia na síntese – de fato, suspiros de luz. As ilustrações de Walter Lara ajudam a que esses momentos sejam fixados, sem perder nem força, nem delicadeza, seja no salto de uma baleia, projetando-se das profundezas. Seja no bater praticamente imperceptível das asas de uma borboleta – ou meramente em reflexos. A magia não se perde, nem nas ilustrações, nem na constatação de que as fadas correm o mundo sem deixar pegadas. Dia ou noite, na mata ou sob a a água, neste livro, a percepção da luz, seja num momento tênue ou ofuscante, gera poesia. Luiz Antonio Aguiar

Blog da Brinque

Suspiros de luz: haicais revelam a delicadeza e a poesia do essencial e do cotidiano “IMÓVEL NA TEIA UMA GOTA DE ORVALHO PRECÁRIO EQUILÍBRIO” Delicado e profundo. Um suspiro. Uma brisa fresca. Essencial, no sentido de ir na essência das coisas. Assim é Suspiros de luz, novo livro de poemas da escritora e poeta Roseana Murray, publicado pela Escarlate, do Grupo Brinque-Book. Tendo publicado dezenas de obras, a maioria poesia, a autora nutre especial relação com um tipo específico de poema, o haicai (ou haiku), matéria-prima luminosa da nova obra. Esse tipo de poesia tem origem no Japão – o poeta Bashô (1644-1694) é um de seus representantes e ficou conhecido como mestre nessa arte – e se caracteriza por estrutura e temas simples: três versos com cinco, sete e cinco sílabas métricas, respectivamente. Em geral, tratam da natureza e de temas do cotidiano. São simples, porém, muito longe de simplórios: é um desafio estético e estilístico escrever com tão poucas letras e palavras. Por isso, o haicai é um poema essencial, de essência. Trata-se de burilar e lapidar ideias, sons, temas até que deles reste o que importa. Um suspiro, que tudo contém. “Os haicais são um presente dos japoneses. Eles são uma estrela cadente, um suspiro de luz, um raio de beleza. Como dizer tanto em três versos? Esse é o desafio do poeta: mergulhar profundamente no instante e colher esses três versos como se fossem flores ainda cheias de orvalho e terra”, define Roseana. Pois esse Suspiros de luz vai na essência dos temas caros à autora e também ao ilustrador, o artista plástico Walter Lara, que imagina e concretiza, em seus traços e cores, o cenário perfeito para acolher as poucas e significativas palavras da poeta. Em uma entrevista ao Blog da Brinque, Walter contou um pouco de seu processo ao criar as maravilhosas ilustrações do livro. “Identifiquei-me com os poemas da Roseana Murray porque são muito visuais, repletos de animais, luminosidade e de uma imensa gama de cores. Estou sempre observando os animais – eles habitam as minhas ilustrações – e com eles aprendo a perfeita escala de cores que neles foi desenvolvida pela natureza há milhares de anos. A Roseana me deu este presente de ilustrar um texto tão musical e perfumado.” O resultado é uma dança, uma conversa entre duas linguagens poéticas distintas que se complementam e jogam luzes – como os vaga-lumes do poema que abriga o título do livro – uma na outra, ressaltando as melhores qualidades. Natureza, entardeceres, cheiros, climas, brisas, insetos e matas, árvores, pássaros: está tudo lá, simples e incrivelmente complexo, pois cada leitura e cada olhada revela novas camadas. A essência, afinal, nunca se mostra por inteiro na primeira espiadela. Em casa e em sala de aula Este é um livro que evidencia como poucos o diálogo entre os diferentes tipos de arte. As palavras de Roseana são belas imagens, que Walter capta e traduz em ilustrações que também contam histórias poéticas. O que os leitores mais jovens enxergam nessas duas formas narrativas? O que as palavras inspiram neles? E as imagens? Ajude-os a reparar nos detalhes e nas sutilezas. Dê a eles elementos para entender o perfume da dama da noite, as metáforas da música que diversas vezes surgem na obra, a caligrafia num voo de gaivota. Quantos já viram um pássaro voar? Que desenhos ele faz? E, numa poesia, o que é essencial e o que não é? O que é essência? São só as palavras, num haicai, que buscam a essência e abandonam o supérfluo? Ou também a temática? O que é essencial nos dias de hoje? O que era essencial nos dias de Bashô? Há beleza e poesia no cotidiano? Na poeira que brinca de brilhar num raio de sol? “O FOGO FAZ MÚSICA ACORDES CREPITAM ILUMINAM O SILÊNCIO” Crédito: Blog da Brinque

Vera Teixeira de Aguiar

O FARDO POÉTICO DE ROSEANA MURRAY   Vera Teixeira de Aguiar   RESUMO No panorama da poesia infantil e juvenil brasileira, destaca-se Roseana Murray (1950), responsável por uma obra contínua iniciada em 1980, com mais de 100 livros de poesia para crianças e jovens. Ao longo de sua carreira, dedicada inteiramente ao fazer poético, é condecorada com inúmeros prêmios literários, também fazendo parte da Lista de Honra do International Board on Books for Young People/IBBY, que abriga os melhores autores de literatura infantojuvenil do mundo. Todas essas láureas nos permitem avaliar a dimensão de seu trabalho que, de há muito, vem atravessando fronteiras.   ABSTRACT In the panorama of Brazilian literature for young people, Roseana Murray (1950) is a reference; she has been writing nonstop since 1980 and has over 100 poetry books for children. She has dedicated her life to poetry and has gained recognition with several awards; also, she is part of the Honor list in the International Board on Books for Young people / IBBY, which takes on world’s best authors in the segment. Such accomplishments allow us to asses the dimension of the author’s work, which has reached broad horizons for some time.    Quando Roseana Murray (1950) estreia na literatura, a poesia destinada a crianças e jovens já conta com uma experiência de quase um século no Brasil. Embora o primeiro livro de grande sucesso seja Poesias infantis, de Olavo Bilac (1865-1918), publicado em 1904, antes dele, nas últimas décadas do século XIX, já aparecem exercícios poéticos, como elogios, conselhos e cumprimentos por datas festivas, conforme lembra Luís Camargo (2009). Ainda vale citarmos Flores do campo, de José Fialho Dutra (1855 – ?), editado em 1882, que, em sua introdução “Ao benigno leitor”, acentua a intenção de oferecer temas cívicos, escolares, religiosos e sentimentais, em tom acentuadamente educativo. À normatividade desses textos, certamente, os versos lúdicos de Bilac se opõem, agradando deveras à infância, embora entre eles se misturem ainda aqueles que visam incentivar boas atitudes por meio da poesia.  No entanto, o ritmo cadenciado da redondilha maior e as imagens familiares típicas de Bilac caem no gosto dos pequenos, que repetem os versos de “O trabalho”:   Tal como a chuva caída Fecunda a terra, no estio, Para fecundar a vida O trabalho se inventou. (p.115)   A partir de então, o gênero oscila entre as duas vertentes – pedagogismo e preocupação estética – com vantagens para a primeira, obstinada em ensinar e transmitir valores às novas gerações. A situação começa a mudar em 1943, com O menino poeta, de Henriqueta Lisboa (1901-1985), que privilegia o olhar da criança e o caráter lúdico do fazer poético.  Em versos curtos e animados, a autora aproxima-se da infância:   O menino poeta quero ver de perto quero ver de perto para me ensinar as bonitas coisas do céu e do mar. (p.39)   Cecília Meireles (1901-1964) consolida tal visão em 1964, quando Ou isto ou aquilo resguarda todas as conquistas de inventividade e liberdade da arte instauradas pelo Modernismo em décadas anteriores. Nesse sentido, o livro infantil mantém a temática intimista da poeta, que cultua a fugacidade da vida e a espiritualidade, acentuada, conforme aponta Miguel Sanches Neto (2001), mesmo através dos motivos infantis, como vemos em “O vestido de Laura”:   Que as estrelas passam, borboletas, flores perdem suas cores.   Se não formos depressa, acabou-se o vestido todo bordado e florido! (p. 44)    Seguem-se outros autores consagrados, como Mário Quintana (1906-1994), que faz sucesso em 1968, com Pé de pilão, cujos versos lúdicos e bem cadenciados estão até hoje no gosto do público, e Vinícius de Moraes (1913-1980), que, em 1970, reúne seus poemas dispersos na conhecida obra A arca de Noé, que recebe, inclusive, versão musical. Desde então, uma gama considerável de poetas tem se dedicado a tal produção, no esforço de criar sons, ritmos e imagens que expressem os modos de ver e sentir o mundo dos novos leitores. Desse panorama, avulta Roseana Murray, nascida em 1950, no Rio de Janeiro, filha dos imigrantes poloneses Lejbus Kligerman e Bertha Gutman Kligerman, que vêm para o Brasil antes da Segunda Guerra fugindo do antissemitismo. Responsável por uma obra contínua iniciada em 1980, ela é autora de mais de 100 livros de poesia para crianças e jovens. Graduada em Língua e Literatura Francesa pela Universidade de Nancy, por meio da Aliança Francesa, dedica-se inteiramente ao fazer poético. É condecorada, ao longo de sua carreira, com os Prêmios: Associação Paulista de Crítica de Arte/APCA, na categoria “Poesia Infantil”; “O Melhor de Poesia” da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil/FNLIJ (por quatro vezes); Prêmio Academia Brasileira de Letras/ABL para “Livro Infantil”. Recebe, ainda, por diversas vezes, o selo “Altamente Recomendável” da FNLIJ. Também faz parte da Lista de Honra do International Board on Books for Young People/IBBY, que abriga os melhores autores de literatura infantojuvenil do mundo. Todas essas láureas nos permitem avaliar a dimensão do trabalho de Roseana que, de há muito, vem atravessando fronteiras. A escritora afirma que, ao começar, não teve em vista escrever diretamente para os pequenos, mas, de certa forma, são eles que se identificam com seus poemas. Na verdade, sua ampla obra pode ser lida por todas as idades. Contudo, os projetos editoriais de seus livros, ricamente ilustrados por artistas reconhecidos, têm apresentação impecável para o público infantil e juvenil. Alguns títulos contam com reedições que ganham novos formatos, incluindo um trabalho gráfico e imagético mais atualizado esteticamente. O primeiro livro de Roseana é Fardo de carinho, publicado em 1980 pela Editora Murinho e reeditado em 1985 e 2009, com ilustrações de Elvira Vigna. Eis a estrofe de abertura: Vaga-lume lume lume ilumina meu caminho que eu carrego um fardo de carinho (s.p.)   O volume já traz, em seu título, a concepção de poesia da autora, que faz um jogo antitético de sentidos: “fardo” é um volume pesado, algo difícil de suportar que, por extensão, implica responsabilidade e cuidado; “carinho”, por sua vez, significa afeto, delicadeza,

Joel Cardoso

POEMAS PARA METRÔNOMO E VENTO Roseana Murray – Guaratinguetá: Penalux, 2018, 110 páginas. Roseana Murray, minha poeta maior… Estou em falta com você. Recebi, há já alguns dias (alguns dias?… que ironia!… já se passaram mais de 30 dias), pelo correio, o livro que me enviou. Cada livro seu é um presente… presente dos deuses… “… o que não pode / ser dito, / onde carregar?” (“Entre as páginas”. p. 50.). Vou tentar me redimir, me justificar… Como estava às voltas com a elaboração do meu MEMORIAL, para ascender ao nível de PROFESSOR TITULAR (que submeto à apreciação da banca avaliativa no próximo dia 2 de outubro), estive o tempo todo preocupado com esta (ingrata) tarefa. Tarefa, repito, ingrata e incômoda, tentando organizar meu caos interior, mesmo sabendo ser “Impossível arrumar / o caos por onde trafegam / as horas (“As horas”, p. 43). Seu livro, seus poemas – que bom! -, foram um bálsamo que minimizaram minha ansiedade, meu atabalhoamento nesse percurso. Claro que cito você nesse memorial. Claro que transcrevo alguns de seus poemas. O poema “Ausência” (p. 62), por exemplo, abre a sessão em que relembro o ‘nosso’ Latuf. No embalo subjetivo que demarcam os passos dessa dança rememorativa, pareceu-me que o poema foi escrito para ele… Poemas não têm endereço… Nós os direcionamos… cada leitor se apodera deles amoldando-os às suas carências, às suas subjetividades, aos seus devaneios… O poema se constrói de palavras indizíveis, estações que, ao aflorarem, redefinem, e alinhavam saberes necessários e insubstituíveis, dos quais nós, às vezes, nem mesmo suspeitávamos. Retirando da vida o que de essencial a nossa sensibilidade permite. Por que “… o poema se faz / com a vida que se vai / vivendo” (“Farinha e Aurora”, p. 82). De repente, ‘não mais que de repente’, perguntamo-nos: “De onde vem / essa linha fina / de costurar poema?” (p. 12). Vem dos anseios da alma, querida… Criação primordial, a poesia se faz necessária. Se é alimento para a alma de quem a produz, se torna, de forma similar, essencial para quem lê. Somos atravessados e modificados pelos versos, aves canoras que, ao sair do corpo do poema, pousam mansamente em nosso ser. E sentimos que é como se sempre estivessem ali… Através dos poemas tomamos consciência de instâncias que desconhecíamos, instâncias que não supúnhamos existirem em nós… instâncias que, sufocadas, reprimidas, abafadas pelos ritos do cotidiano, buscam espaço para, ao domesticar a nossa solidão, quebrar muros cerceadores do nosso interior… Não é que “a vida / não é tarefa / pequena, / às vezes é dor / e pedra! (“Pipa”, p. 17)?… No poema, os versos, ao se manifestarem plenos, alados, lírica e sonoramente, pousam de mansinho em nós… Com a poesia desvendamos o que há de divino, o que há do sagrado-profano que paradoxalmente nos habita. Somos nós mesmos e as nossas sombras, as nossas regiões abissais dominadas, incorporadas… e somos, também, especularmente, o outro, em sua dimensão paralela… A poesia é o nosso registro de permanência no efêmero que se eterniza. Através dela, despimos as nossas mascaras, abdicamos dos nossos nomes, dos prenomes, dos pronomes… Reinventamo-nos… Conferimo-nos novos rostos, novas fisionomias e nos (a)firmamos, nos reconhecemos em todos eles… Buscamos novos sentidos, mais que isso, necessitamos deles. “Como desembaraçar / os fios, / os rios, / oceanos, / montanhas / as linhas do passado / e as teias do futuro?” (“Bagagem”, p. 57). A precariedade da palavra nos abre portas, nos conduz às metáforas… metáforas que alteram a rotação do nosso universo… Somos todos linguagem e escritura, signos e símbolos, realidades e devaneios, interligamos o efêmero à eternidade, soletramos alfabetos desconhecidos. Os poemas, ao se auto traduzirem, nos traduzem também. Textos que, numa teia interminável, remetem a outros textos. “Um verso simples, / sozinho, / não tece a manhã: / é preciso um galo / e um sol, / nas mãos um sonho / ainda sujo de estrelas / ainda sujo de infinito.” (“Um verso e outro”, p. 58). Assim como o dia, festa que nos surpreende a cada amanhecer, ao se revelar em suas nuances, movendo as nuvens do nosso céu interior, a poesia nos encanta, nos comove, nos absorve, nos alimenta. Somos a mistura do que fomos, com aquilo que, no presente, nos tornamos… somos também as nossas expectativas futuras, os nossos desejos de agora entrelaçados às marcas, aos vestígios de um passado que insiste, persiste, resiste. “O passado / era essa água / estranha, / feita de tempo, / ilusão, / bruma fugidia” (p. 37), e, quase sempre, tão exigente, tão ali bem pertinho, de plantão… Apaziguamos a noite dos nossos desejos… acendemos estrelas novas na nossa constelação eivada de desejos, povoada de ansiedades, modeladas pela amplitude da nossa solidão… E assim vamos nós “pelas ruas do tempo, / com as sobras, / o corpo abarrotado / de tudo o que pode / entornar no poema (“Sobras”, p. 38). Presente, exigência do agora, a vida singra e sangra na estrada dos versos… as palavras redefinem os contornos da nossa existência, realidade e sonho, testemunho e negação da realidade. Você personifica, para mim, a nossa poeta maior. Uma poeta que, despindo as palavras do sentido que as vestes do cotidiano lhe atribuem, confere novos sentidos a elas. Seguimos sempre, por vezes, à nossa revelia, sabendo que “em algum lugar / o destino / prepara as suas / encruzilhadas” (!Encruzilhadas”, p. 61). E isso é muito… Com você, me permito voar… Sabendo que “Para alçar voo / um pensamento / basta…” (“Lição de Voo, p. 52). Por isso eu a amo. Obrigado por tudo… Beijos n’alma Joel Cardoso – Universidade Federal do Pará – UFPA

Neurivan Sousa

O ótimo livro “Poemas para metrônomo e vento”, da consagrada Roseana Murray, (Penalux, 2018), traz uma poesia sob medida que nos enlaça pela sutileza e deslumbramento das imagens. A densidade de seus poemas é de água e de pedra e de ventos e de árvores e de luas e de luz… Sua voz é de uma sonoridade rítmica tão delicada que se confunde com a polifonia produzida pelo beijo da aragem nas cortinas dos nossos olhos. É ler e se deixar levar pela fluidez de um rio manso e maiúsculo. Neurivan Sousa Professor – Santa Rita/MA

William Amorim

Uma alegria indescritível: chegar em casa e me deparar com um exemplar autografado, trazido pelos correios , do novo e belíssimo livro da poeta Roseana Murray. Poemas para metrônomo e vento é para ser lido com o corpo todo porque cada poema faz do leitor uma partitura viva, como se a poeta orquestrasse o tempo, o compasso e a pulsação musical em que cada um de nossos poros devesse vibrar sob inusitadas epifanias engendradas na beleza e na variação de cada verso. William Amorim Psicanalista