A luz do Sertão de Olho D’Água, do romance Outros Cantos, de Maria Valéria Rezende inundou a sala do nosso Clube de Leitura da Casa Amarela.
Foram muitas viagens e muitos tempos em nossa viagem. Assim como a personagem Maria, dentro de um ônibus, aos solavancos, volta ao passado numa longa noite atravessada de memórias, cada um de nós se viu enredado nos fios coloridos dessa imensa rede de afetos e acolhimentos, quando Maria, ao ser despejada em seu exílio, na verdade nos leva com seu corpo miúdo a vivenciar a experiência mais bela de amor. Ela, que chega de outros exílios para ensinar, terá que aprender o que não se ensina em nenhuma escola.
O livro nos trouxe muitas questões: o excesso de nossa sociedade de consumo, onde o objeto vale mais que a pessoa e o sentimento de infelicidade que isso traz.
O contraste com a dureza da vida dessa comunidade onde nada havia, onde a água era o maior tesouro, mas o amor e a aceitação do outro era a verdadeira água. A escassez dá lições de amor.
Falamos de como o livro trabalha fortemente com todos os nossos cinco sentidos e sentimentos.
Ao abrir a sua caixinha mágica do tesouro, Maria nos faz abrir a nossa e desata a nossa memória, cada um de nós já passou por desertos e exílios.
O livro é feito de cenas belíssimas, prontas para um filme.
Máximo, nosso leitor cineasta chamou a atenção para a escuridão do ônibus, a sua penumbra. Ao voltar ao passado com a personagem, ao voltar quarenta anos para trás, a luz quase nos cega.
Cesar Alves nos contou que cada segundo livre que tinha, corria para o livro.
Todos nos apaixonamos por Fátima, a grande mulher do romance.
Todos falamos da fé que era a chama da sobrevivência dessa comunidade privada de tudo.
E ao entrelaçar o livro de Cineas Santos, Dona Purcina, com o Outros Cantos, a nossa emoção foi verdadeiramente intensa.
Dona Purcina nos leva também ao Sertão, mas de uma outra maneira. Marcia Borges nos diz: Maria veio de fora, mas D.Purcina já estava lá dentro.
Cinéas nos conta a história dessa menina que se transforma numa mulher extraordinária, que não tinha como estudar, (como os habitantes de Olho D’Água), mas fez o impossível para que seus filhos estudassem. A dureza de sua vida no Sertão e na pequena cidade para onde leva os filhos, vai sendo contada em textos curtos, cheios de poesia e humor, até que ao se olhar no espelho um dia e não mais se reconhecer, sabemos que o livro existe porque Cinéas também precisava construir a sua caixa do tesouro para guardar Dona Purcina.
Os dois livros nos emocionaram imensamente.
Tivemos muitas pessoas ausentes por motivos diversos e novos leitores chegaram para dividirmos o pão e o vinho em torno de um livro, num ritual magnífico que começou em 2010 e se repete de dois em dois meses.
Em julho nosso encontro será em Visconde de Mauá e vamos ler Jacques, o fatalista e seu amo, do Diderot e o poema Liberdade de Paul Éluard.