Blog da Brinque

Suspiros de luz: haicais revelam a delicadeza e a poesia do essencial e do cotidiano

“IMÓVEL NA TEIA
UMA GOTA DE ORVALHO
PRECÁRIO EQUILÍBRIO”

Delicado e profundo. Um suspiro. Uma brisa fresca. Essencial, no sentido de ir na essência das coisas. Assim é Suspiros de luz, novo livro de poemas da escritora e poeta Roseana Murray, publicado pela Escarlate, do Grupo Brinque-Book. Tendo publicado dezenas de obras, a maioria poesia, a autora nutre especial relação com um tipo específico de poema, o haicai (ou haiku), matéria-prima luminosa da nova obra.

Esse tipo de poesia tem origem no Japão – o poeta Bashô (1644-1694) é um de seus representantes e ficou conhecido como mestre nessa arte – e se caracteriza por estrutura e temas simples: três versos com cinco, sete e cinco sílabas métricas, respectivamente. Em geral, tratam da natureza e de temas do cotidiano.

São simples, porém, muito longe de simplórios: é um desafio estético e estilístico escrever com tão poucas letras e palavras. Por isso, o haicai é um poema essencial, de essência. Trata-se de burilar e lapidar ideias, sons, temas até que deles reste o que importa. Um suspiro, que tudo contém.

“Os haicais são um presente dos japoneses. Eles são uma estrela cadente, um suspiro de luz, um raio de beleza. Como dizer tanto em três versos? Esse é o desafio do poeta: mergulhar profundamente no instante e colher esses três versos como se fossem flores ainda cheias de orvalho e terra”, define Roseana.

Pois esse Suspiros de luz vai na essência dos temas caros à autora e também ao ilustrador, o artista plástico Walter Lara, que imagina e concretiza, em seus traços e cores, o cenário perfeito para acolher as poucas e significativas palavras da poeta.

Em uma entrevista ao Blog da Brinque, Walter contou um pouco de seu processo ao criar as maravilhosas ilustrações do livro.

“Identifiquei-me com os poemas da Roseana Murray porque são muito visuais, repletos de animais, luminosidade e de uma imensa gama de cores. Estou sempre observando os animais – eles habitam as minhas ilustrações – e com eles aprendo a perfeita escala de cores que neles foi desenvolvida pela natureza há milhares de anos. A Roseana me deu este presente de ilustrar um texto tão musical e perfumado.”

O resultado é uma dança, uma conversa entre duas linguagens poéticas distintas que se complementam e jogam luzes – como os vaga-lumes do poema que abriga o título do livro – uma na outra, ressaltando as melhores qualidades.

Natureza, entardeceres, cheiros, climas, brisas, insetos e matas, árvores, pássaros: está tudo lá, simples e incrivelmente complexo, pois cada leitura e cada olhada revela novas camadas. A essência, afinal, nunca se mostra por inteiro na primeira espiadela.

Em casa e em sala de aula
Este é um livro que evidencia como poucos o diálogo entre os diferentes tipos de arte. As palavras de Roseana são belas imagens, que Walter capta e traduz em ilustrações que também contam histórias poéticas. O que os leitores mais jovens enxergam nessas duas formas narrativas? O que as palavras inspiram neles? E as imagens?

Ajude-os a reparar nos detalhes e nas sutilezas. Dê a eles elementos para entender o perfume da dama da noite, as metáforas da música que diversas vezes surgem na obra, a caligrafia num voo de gaivota. Quantos já viram um pássaro voar? Que desenhos ele faz?

E, numa poesia, o que é essencial e o que não é? O que é essência? São só as palavras, num haicai, que buscam a essência e abandonam o supérfluo? Ou também a temática? O que é essencial nos dias de hoje? O que era essencial nos dias de Bashô? Há beleza e poesia no cotidiano? Na poeira que brinca de brilhar num raio de sol?

“O FOGO FAZ MÚSICA
ACORDES CREPITAM
ILUMINAM O SILÊNCIO”

Crédito: Blog da Brinque